quarta-feira, 24 de julho de 2024

Velho, não, entardecido.

"Velho, não.

Entardecido, talvez.

Antigo, sim.


Me tornei antigo

porque a vida,

tantas vezes, se demorou.

E eu a esperei

como um rio aguarda a cheia".

(Mia Couto)


Ela casou tarde e por isso nunca teve filhos. 

Ela ficou viúva muito cedo. Acho que foi seu primeiro e único namorado, então experiência não teve.

Ela agora já é idosa, não quer revelar a idade, mas aqui eu digo, ela já completou 80 anos. 

A pele e o rosto já não são mais jovens, viçosos e cheios de colágeno. Mas o coração ainda quer e espera por um amado. 

Alguns fragmentos de esperanças, algumas falsas ilusões. 

O etarismo é doloroso e categorizar a vida de pessoas pela sua idade me parece uma atitude covarde. Por que o amor tem idade? Por que se sentir amada é só privilégio de determinada faixa etária?

Nos meus 20 e poucos anos era bombardeada por cobrança de um casamento. Falavam "você está velha, precisa arranjar um namorado para casar antes dos 30". Casei aos 32 e veio a cobrança por filho logo, porque eu já estava velha e o relógio biológico estava correndo, a ansiedade e as informações de que os óvulos envelheciam e ficavam escassos. Tive filho aos 40. Parece que passei toda uma vida achando que estava velha. Até hoje me sinto velha. Parece que nunca fui jovem. 

Mas ela aos 80 me fala que se sente nova e pede  que eu capriche na foto pra não aparecer a papada e fala de um paquera que tem "braços roliços" e sonha em novamente ser amada. Ela tem esse direito. Eu torço muito por ela. 

Lembro de um filme de 1995: As Pontes de Madison. Assisti mais de uma vez e até hoje me lembro de várias cenas e falas. É uma história de amor maduro, onde os protagonistas já não são tão jovens, mas que vivem um amor intenso, gostoso, apesar de doloroso. É um filme lindo, marcante, que me faz pensar que todos tem o direito de viver um grande amor, se assim o querem. Independente de idade, independente de aparência. Que seja aos 80 anos, no final da vida ou na idade que for, mas que simplesmente aconteça.


 "Uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. (...)V-

Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora de minha própria vida. Foi o apesar de que parei na rua e fiquei olhando para você enquanto você esperava um táxi. E desde logo desejando você, esse teu corpo que nem sequer é bonito, mas é o corpo que eu quero. Mas quero inteira, com a alma também. Por isso, não faz mal que você não venha, esperarei quanto tempo for preciso".

(Clarice Lispector)


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