sexta-feira, 28 de maio de 2010

Uma lembrança

Uma lembrança é reincidente a minha memória todas as noites e eu não sei por quê. Uma lembrança de quando eu estudava Engenharia Química. Faz um tempinho bom.
Lembro que combinei com alguns colegas de fazer um trabalho, agora não lembro de que matéria era, na verdade hoje eu não lembro mais a diferença entre Química Analítica Qualitativa e Química Analítica Quantitativa, ou entre Química Inorgânica e Físico-Química, eu só sei o que é Química Orgânica por causa do Carbono. (ou não tem Carbono?), enfim... marcamos de nos encontrar todos no terminal de ônibus pra esperar a colega dona da casa onde íamos fazer o trabalho.
Ela bem se atrasou, mas chegou, veio com uma aparência meio cansada, meio deprimida, triste mesmo.
Durante todo o trabalho ela ficou sentada calada na mesa com ar choroso, depois de algum tempo pediu licença dizendo que ia tomar um banho e saiu, entrou no banheiro e chorou copiosamente. Não lembrou da  da acústica que o banheiro tinha, nem da janelinha que ventilação que dava bem pra sala onde estávamos. Chorou durante um bom tempo. Um choro de quem tinha perdido alguém. Um choro dolorido como nunca tinha ouvido até então.
Ao voltar, com o rosto e olhos vermelhos, sentou a mesa, pediu desculpas e contou sua história.

Tinha passado o final de semana passado inteiro com seu amado, foram pra uma fazenda, andaram a cavalo, fizeram juras de amor. E então, naquele dia, naquela tarde, uma quarta-feira da mesma semana, ela tinha ficado sabendo que ele se casara com outra.
Eu ainda não conhecia as dores do coração. Não entendia as "razões" que o amor tem. Não entendi porque ela chorava por alguém que não era seu, que nunca fora seu, por que tinha se envolvido a tal ponto num relacionamento que tendia previsivelmente ao fracasso. Nem eu entendi, nem ninguém que estava ali.
Mesmo abalada, ele se ofereceu pra terminar o trabalho, encaderná-lo e entregá-lo para apresentação no dia determinado. Incrível como a gente permitiu isso.
No dia da apresentação ela mandou o trabalho inacabado por uma outra pessoa mas não apareceu. Depois disso abandonou a faculdade e nunca mais apareceu. Aquela tarde foi o último dia que a vimos.

Por que tenho lembrado disso quase todas as noites eu não sei. Hoje eu entendo e conheço a dor que ela sentiu aquele dia, conheço o pranto chorado no banheiro frio, entendo os motivos. Queria ter dito alguma palavra de conforto, ter feito alguma coisa, mas não disse, não liguei.
E hoje nem sequer lembro mais do nome dela.


quarta-feira, 26 de maio de 2010

Insistência

"Estou sozinho e nunca aprendi a estar sozinho. Estou sozinho.
Sinto falta de palavras. Estou sozinho. Estou sozinho.
Sinto falta de uns olhos onde possa imaginar. Estou sozinho.
Sinto falta de mim em mim."

José Luís Peixoto - Insistência

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Crônica de um amor anunciado

Toda pessoa apaixonada é um publicitário em potencial. Não anuncia cigarros, hidratantes ou máquinas de lavar, mas anuncia seu amor, como se vivê-lo em segredo diminuísse sua intensidade. O hábito começa na escola. O caderno abarrotado de regras gramaticais, fórmulas matemáticas e lições de geografia, e lá, na última página, centenas de corações desenhados com caneta vermelha. Parece aula de ciências, mas é introdução à publicidade. Em breve se estará desenhando corações em árvores, escrevendo atrás da porta do banheiro e grafitando a parede do corredor: Suzana ama João.

A partir de uma certa idade, a veia publicitária vai tornando-se mais discreta. Já não anunciamos nossa paixão em muros e bancos de jardim. Dispensa-se a mídia de massa e parte-se para o telemarketing. Contamos por telefone mesmo, para um público selecionado, as últimas notícias da nossa vida afetiva. Mas alguns não resistem em seguir propagando com alarde o seu amor. Colocam anúncios de verdade no jornal, geralmente nos classificados: Kika, te amo. Beto, volta pra mim. Everaldo, não me deixe por essa loira de farmácia. Joana, foi bom pra você também?

O grau máximo de profissionalismo é atingido quando o apaixonado manda colocar sua mensagem num outdoor em frente a casa da pessoa amada. O recado é para ela, mas a cidade inteira fica sabendo que alguém está tentando recuperar seu amor. Em grau menor de assiduidade, há casos em que apaixonados mandam despejar de um helicóptero pétalas de rosas no endereço do namorado, ou gastam uma fortuna para que a fumaça de um avião desenhe as iniciais do casal no céu. A criatividade dos amantes é infinita.

O amor é uma coisa íntima, mas todos nós temos a necessidade de torná-lo público. É a nossa vitória contra a solidão. Assim como as torcidas de futebol comemoram seus títulos com buzinaços, foguetório e cantorias, queremos também alardear nossa conquista pessoal, dividir a alegria de ter alguém que faz nosso coração bater mais forte. É por isso que, mesmo não sendo adepta do estardalhaço, me consterno por aqueles que amam escondido, amam em silêncio, amam clandestinamente. Mesmo que funcione como fetiche, priva o prazer de ter um amor compartilhado.

--Martha Medeiros

terça-feira, 4 de maio de 2010

Regresso

Outrora eu era daqui, e hoje regresso estrangeiro, 
Forasteiro do que vejo e ouço, velho de mim. 
Já vi tudo, ainda o que nunca vi, nem o que nunca verei. 
Eu reinei no que nunca fui.
Fernando Pessoa

sábado, 1 de maio de 2010

Feriado em Salvador

Um dos cenários do nosso relacionamento.
Em Salvador muitas coisas boas aconteceram, muitas histórias e lembranças, algumas ruins, mas vir aqui é sempre muito bom.