Aos exibicionistas

“Diga-me do que te gabas que eu te direi o que te falta”. 
 A frase inteligente e bem-humorada de Mira y Lopes fala de um velho conhecido nosso: o basofo, o esparolado, vulgo gabola. Quem não conhece um homem ou uma mulher para quem somente coisas esplendorosas acontecem? E aquele tipo que fala o tempo todo na primeira pessoa do singular e é um verdadeiro prodígio quando se trata de “ajudar”? É o primeiro a dizer o que os outros deveriam fazer. Usa e abusa do jargão “mas eu sabia!” ou, pior ainda: “eu avisei!”.
Por trás da gabolice está uma vaidade extremada, fruto de um ego inflamado, diametralmente oposto ao distanciamento vinculado à autocrítica - expressão, aliás, que passa longe do vocabulário do ególatra. Ingenuamente confundida com amor próprio e autoestima, a insuflação do ego aparenta segurança. Mas basta um olhar mais atento para se perceber que tudo não passa de aparência, de camuflagem. Por baixo da camada do “eu sou o máximo”, encontra-se um ser frágil, com baixíssimo amor próprio. São aqueles homens e mulheres que se julgam acima de qualquer outro ser, merecedores de aplausos e manifestações de admiração constantes. Precisam, desesperadamente, de reconhecimento. Estão sempre “bem” com todos, não pelo que são - já que isso escondem até de si mesmos, mas porque manipulam habilmente as armas da bajulação, sob uma inofensiva e estudada causalidade...
Todo gabola tem uma visão distorcida e maximizada de si e, numa sociedade enfeitiçada pela fixação no ego, não é de se admirar que pessoas psicologicamente fracas sucumbam com tanta ênfase à idolatria de si mesmas. Veem-se como “os grandes conquistadores”, engajam-se em muitos relacionamentos, pela simples e veemente necessidade da conquista e do domínio. Precisam sentir-se no comando das pessoas e dos acontecimentos para que se sintam aceitos e amados. Prometem mundos e não cumprem nada. Divertem-se jogando charme vazio para uma plateia que acaba por se cansar de tanto esforço vão. Sem a estampa, sem a maquiagem, sem a indumentária e as prováveis afetações, sentem-se vazios. E este é o seu maior pavor. Para não encará-lo, desdobram-se enganando a si mesmos e aos que vagueiam distraídos.
Exibicionistas, não se envolvem de verdade com alguém ou alguma causa. Talvez nem saibam o que seja isto. De vez em quando, caem em exaustão pelo dispêndio excessivo de energia em representações, sobrevindo uma profunda melancolia. Nestes casos, a culpa “é sempre dos outros”. Constroem sua imagem em alicerces vagos, fugidios e irreais que esfarelam na primeira confrontação. Trabalham duro para manter a fachada que produz fascínio – temporário –, diga-se de passagem. Em última análise, não o fazem para si, mas para alimentar a figura que criaram e da qual dependem. Nutrem-se de elogios e dos olhares que teimam dizer que sempre são em sua direção. Bem no fundo, mas não admitindo, sabem que, sem os artifícios, são desprovidos de graça. E, para que isso não aconteça, lançam mão de qualquer aparato que os faça parecer melhor do que os outros e que esconda muito bem seus inconfessáveis defeitos.
Falam o que querem e quando querem, mas detestam ser contrariados. Provedores atentos de soluções estereotipadas para os outros, entoam, como um mantra, o conhecido “ah, se fosse comigo!”. Palpite é com eles; quase sempre iniciado com um surrado “não tenho nada a ver com isso, mas...”, seguido de um rosário de conselhos e sugestões. Adoram um fuxico e a oportunidade de destilar veneno e, com isto, autopromover sua imagem. Empenham-se tanto neste mister que nem percebem o quanto são ridículos e invasivos. Georges Elliot escreveu de forma simplesmente genial:
“abençoado o homem que, não tendo nada a dizer, se abstém de demonstrá-lo em palavras”. 
Abraham Lincoln foi mais fundo: 
“é melhor calar-se e deixar que as pessoas pensem que você é um idiota do que falar e acabar com a dúvida”.

(retirado do Jornal de Canela/RS - AnoXXV - edição 1304)

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