Balanço de final de ano

Como a maioria das pessoas, tirei o restinho do ano pra fazer um balanço do que ele foi. Como a maioria das pessoas, posso dizer que o saldo foi positivo, mas como final de ano significa pra mim também idade nova, pois janeiro passa voando e logo chega o começo de fevereiro, sempre faço um balanço da minha vida inteira. Ainda mais agora que vou entrar no meu último ano da era pré-balzaquiana. 

Outro dia uma amiga comentou sobre o grupo de louvor da igreja e completou com a seguinte frase: "Era pra você estar cantando ainda". Fiquei irritada porque ela sabe muito bem porque eu saí do grupo, mas é certo que as pessoas têm memória curta, principalmente no que se refere aos fatos que não lhe dizem respeito. 

Penso que se era pra eu estar fazendo alguma coisa, se era para eu estar em algum lugar, eu estaria fazendo, eu estaria lá, independente do que acontecesse. Isso é acreditar no destino? Eu nem sei se acredito no destino. Só sei a vida nos leva por caminhos que muitas vezes não são desejados, nem buscados, por nós. 

Esse ano que agora acaba foi estranho para mim. Passei a minha vida inteira achando que para ser feliz eu tinha que ser uma menina obediente aos mandamentos, ir à igreja, a casa de Deus, participar, tentar não pecar, namorar e casar com uma pessoa da mesma fé, evitando assim o tal do jugo desigual. 

Jugo desigual... as piores pessoas com quem me relacionei foram da "mesma fé". Os piores namorados que tive foram os da igreja. Por fim, os próprios "irmãos" acabaram me tirando a única coisa que me restava de importante dentro daquele lugar. 

É incompreensível. Todas as outras igrejas vivem à caça de membros, a igreja em que fui criada só se preocupou em me fazer desistir de estar nela. Às vezes, ou quase sempre, quando lembro desse fato, tentando compreender o que aconteceu, fico com o olhinho cheio de lágrima. 

Ainda lembro do que me disseram no dia em que percebi que eu não era mais bem vinda ali. Por causa de comprimentos, cores, regras que não cumpri, me disseram que eu não tinha mais nenhum direito ali dentro, que eu era rebelde, a pior de todos, questionaram o que eu estava fazendo ali e perguntaram por que eu fui namorar uma pessoa mundana se eu sabia que não podia. 

Como se não bastasse um mundo que exclui porque você é negro, pobre ou mulher, a igreja também exclui os que não se adeqüam aos conceitos que seus próprios líderes criam. Eu fui excluída. Excluída da igreja onde estive por 25 anos. Excluída. Repito pra mim mesma, tentando pelo muito repetir tornar a palavra menos agressiva. Fui excluída quando eu só queria estar lá. Eu só queria cantar junto com as pessoas que eu julgava serem meus amigos, mas que no fim só se mostraram interessados no que eu podia lhes favorecer, como os passeios no meu carro ou os cds que eles usavam. Eu só queria estar lá, mas não me deixaram ficar. 

Agora, depois de alguns meses, os mesmos que me expulsaram, têm a cara-de-pau de me convidar a visitar a igreja ou voltar a freqüentar. Fazem pregações demagogas e apelos hipócritas. Outros, esquecidos, ainda me perguntam por que foi mesmo que eu saí da igreja. E eu, depois de tantos meses, não consigo ouvir as músicas que eu cantava sem chorar. 

Passei a minha vida inteira acreditando que naquele lugar eu poderia ser uma pessoa melhor, mas em 2007 prefiro continuar acreditando que a casa de Deus não é um templo de tijolo, cimento e concreto, que para ser uma pessoa boa não é preciso seguir leis e regras de conduta. A casa de Deus é dentro da gente, e nos tornamos pessoas boas justamente por Ele estar ali. E isso basta.

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